terça-feira, 31 de julho de 2012

Mude! by Clarice Lispector....esta eu não penso; eu sinto!


                   
                     Mudar.





Mude, mas comece devagar,
porque a direção é mais importante
que a velocidade.

Sente-se em outra cadeira,
no outro lado da mesa.
Mais tarde, mude de mesa.

Quando sair,
procure andar pelo outro lado da rua.
Depois, mude de caminho,
ande por outras ruas,
calmamente,
observando com atenção
os lugares por onde
você passa.

Tome outros ônibus.
Mude por uns tempos o estilo das roupas.
Dê os teus sapatos velhos.
Procure andar descalço alguns dias.

Tire uma tarde inteira
para passear livremente na praia,
ou no parque,
e ouvir o canto dos passarinhos.

Veja o mundo de outras perspectivas.
Abra e feche as gavetas
e portas com a mão esquerda.

Durma no outro lado da cama…
depois, procure dormir em outras camas.

Assista a outros programas de tv,
compre outros jornais…
leia outros livros,
Viva outros romances.

Não faça do hábito um estilo de vida.
Ame a novidade.
Durma mais tarde.
Durma mais cedo.

Aprenda uma palavra nova por dia
numa outra língua.
Corrija a postura.
Coma um pouco menos,
escolha comidas diferentes,
novos temperos, novas cores,
novas delícias.

Tente o novo todo dia.
o novo lado,
o novo método,
o novo sabor,
o novo jeito,
o novo prazer,
o novo amor.
a nova vida.

Tente.
Busque novos amigos.
Tente novos amores.
Faça novas relações.

Almoce em outros locais,
vá a outros restaurantes,
tome outro tipo de bebida
compre pão em outra padaria.
Almoce mais cedo,
jante mais tarde ou vice-versa.

Escolha outro mercado…
outra marca de sabonete,
outro creme dental…
tome banho em novos horários.

Use canetas de outras cores.
Vá passear em outros lugares.

Ame muito,
cada vez mais,
de modos diferentes.

Troque de bolsa,
de carteira,
de malas,
troque de carro,
compre novos óculos,
escreva outras poesias.

Jogue os velhos relógios,
quebre delicadamente
esses horrorosos despertadores.

Vá a outros cinemas,
outros cabeleireiros,
outros teatros,
visite novos museus.

Se você não encontrar razões para ser livre,
invente-as.
Seja criativo.

E aproveite para fazer uma viagem
despretensiosa,
longa, se possível sem destino.

Experimente coisas novas.
Troque novamente.
Mude, de novo.
Experimente outra vez.

Você certamente conhecerá coisas melhores
e coisas piores do que as já conhecidas,
mas não é isso o que importa.

O mais importante é a mudança,
o movimento,
o dinamismo,
a energia.
Só o que está morto não muda !

Repito por pura alegria de viver:
a salvação é pelo risco, sem o qual a vida não
vale a pena!!!!

(Clarice Lispector - Una propuesta de Vida Creativa)



Este não é meu, mas é lindo e por isso faz parte das coisas que eu penso....

Amor Maduro





                                              



O amor maduro não é menor em intensidade.
Ele é apenas quase silencioso. Não é menor em extensão.
É mais definido, colorido e poetizado.
Não carece de demonstrações: presenteia com a verdade do sentimento.
Não precisa de presenças exigidas: amplia-se com as ausências significantes.

O amor maduro somente aceita viver os problemas da felicidade.
Problemas da felicidade são formas trabalhosas de construir o bem e o prazer.
Problemas da infelicidade não interessam ao amor maduro.

O amor maduro cresce na verdade e se esconde a cada auto-ilusão.
Basta-se com o todo do pouco.
Não precisa nem quer nada do muito.
Está relacionado com a vida e a sua incompletude, por isso é pleno em cada ninharia por ele transformada em paraíso.
É feito de compreensão, música e mistério.
É a forma sublime de ser adulto e a forma adulta de ser sublime e criança.
O amor maduro não disputa, não cobra, pouco pergunta, menos quer saber. Teme, sim. Porém, não faz do temor, argumento.
Basta-se com a própria existência.
Alimenta-se do instante presente valorizado e importante porque redentor de todos os equívocos do passado.
O amor maduro é a regeneração de cada erro.
Ele é filho da capacidade de crer e continuar, é o sentimento que se manteve mais forte depois de todas as ameaças, guerras ou inundações existenciais com epidemias de ciúme.

O amor maduro é a valorização do melhor do outro e a relação com a parte salva de cada pessoa.
Ele vive do que não morreu mesmo tendo ficado para depois.
Vive do que fermentou criando dimensões novas para sentimentos antigos, jardins abandonados cheios de sementes.
Ele não pede, tem.
Não reivindica, consegue.
Não persegue, recebe.
Não exige, dá. Não pergunta, adivinha.
Existe, para fazer feliz.
Só teme o que cansa, machuca ou desgasta.








(Artur da Távola)

















O complexo de Fiona




Cada princesa tem o príncipe que merece...



             
Ao longo dos séculos pudemos observar fábulas encantadoras, sobre meninas que viram seu mundo se modificarem por causa de um homem; um belo e gentil cavaleiro montado em seu cavalo branco, que chegava para salvá-la. Salvá-la de tudo e de todos; de si mesma até. Salvá-la de todos os que a maltratavam, humilhavam, exploravam e desprezavam... triste sina a dela! Em todos os contos, sempre havia uma figura má, perversa, premeditada e manipuladora... sempre disposta a planejar uma cilada ou uma vingança....sempre com feitiços, sempre com aliados, sempre pondo em cativeiros as belas mocinhas cujo único defeito, eram ser belas, boas e verdadeiras. As cinderelas, as borralheiras, as encarceradas das torres, as perdidas das florestas... Todas elas nos remetem a uma estória de sofrimento e superação. E o castigo, sempre vem para os que se decidem pelo mal. Princesas, ricas, belas, muito amadas e felizes para sempre...
Quanta semelhança com os dias atuais, não?   Na escola, nos cursinhos, no trabalho, na vizinhança, enfim, por toda parte lá estão elas, as princesas e as bruxas! Mas a semelhança para aqui. Sabe por quê? Porque este mundo não foi feito de finais felizes e sim, de muitas histórias frustradas pela expectativa não alcançada, pelos sonhos não realizados.  Falta em nós, em nossa formação e educação, o entendimento de que fábulas existem somente para isso: preencher a dura realidade de uma jovem com as ideias deturpadas a respeito do ideal de companheiro que buscam. É por isso que eu gosto tanto da história do Shrek. Não pelo personagem em si, que, aliás, é bem grosseiro e bem mal educado! Mas pela bela lição que nos dá, de que a nobreza de um homem, está no seu caráter, na sua dignidade. 
Diferentemente deste tal príncipe do cavalo branco tão desejado, o que ocorre, é a figura de um homem rude, feio, fedido e mal humorado... Além de péssimos modos, ele é impaciente e assumidamente, cumpre a sua tarefa pelo simples fato de se beneficiar com a posse definitiva do seu lugar, a saber, um pântano, veja só! Para isto deveria munir-se de muita coragem para resgatar uma princesa, que há muito vivia numa torre, vitimada por um feitiço que a transformava numa moça belíssima de dia e horrenda à noite.  Coragem não faltava àquele homem e só havia um empecilho; derrotar o dragão que tinha a função de manter longe daquele lugar qualquer um que tentasse salvá-la daquele triste destino... E assim passavam os dias da princesa, a espera de um salvador. O que vemos a seguir, é um bravo homem que ao invés de um alazão, tinha em sua companhia um burro falante! Esta história tinha tudo para dar errado... Mas não deu por uma única razão; apesar da aparente diferença entre os dois, havia escondida uma semelhança tão grande que na caminhada rumo as suas vitórias, ambos descobriram serem de fato feitos um para o outro.....Missão cumprida! Para uma princesa, um príncipe e um reino; para um ogro, um pântano e um enorme grupo de segregados sociais, seres inusitados que viviam à margem daquela sociedade. Ok, cada um no seu quadrado poderia assim dizer... Mas não foi o que aconteceu. A princesa descobriu que aquele príncipe era uma ilusão e que aquele ogro era uma realidade em seu coração... Que beleza era um conceito relativo e que caráter era um fator incondicional. O feitiço só findaria com o verdadeiro amor e ela só encontrou na figura de Shrek... Ele por sua vez, aprendeu a ser rejeitado. Sabia que numa sociedade soberba e interesseira, ter beleza e status era fundamental, portanto seguiria seu destino sozinho sendo sua melhor companhia. Mas Não conseguindo esquecer aquela princesa, que apesar de parecer petulante e mimada era também muito divertida e sensível, decidiu ir em busca de uma chance com ela....o final todos conhecem: Ela descobre ser também uma ogra e entrega-se a sua condição e a seu amor por seu grande e valente homem do pântano.

Moral da história:
Quantas vezes perdemos a chance de ser feliz vivendo uma história possível com amores possíveis, por causa de uma busca constante de viver uma história fabulosa, com príncipes que na verdade só existem, no imaginário... Que as contas vêm, as brigas vêm, as pazes, vem, os filhos vem, os netos vem enfim, a vida acontece não enquanto eu faço os planos, mas enquanto eu os realizo. De forma real e possível e não esperando os finais que só serão felizes, se construímos um presente consciente de que, a despeito das dificuldades, das bruxas, das tentativas inimigas de nos derrotar e impedir nossa felicidade encontraremos nosso lugar junto a um coração valente que nos ame e nos respeite e zele por nós, pelo cuidado de se querer bem a quem se tem. Se você encontrar alguém assim, agarre-o! Você encontrou a felicidade e o verdadeiro sentido da vida: fazer alguém feliz e entregar-se a alguém que a mereça. Se ainda não encontrou, espere. Reveja seus conceitos, avalie melhor seus valores e com certeza a vida trará até você, alguém não à altura do que você deseja ter, mas à profundidade do que você mereça ser amada.
Boa sorte!